A pandemia da Covid 19 está completando dois anos e neste período o termo doomscrolling ou mesmo doomsurfing, faz referência à compulsão por ler más notícias em redes sociais ou sites de notícias. Tais termos começaram a ganhar espaço nas discussões e análises de neurocientistas, especialistas em saúde mental e sites de tecnologia. O doomscrolling sintetiza o hábito de ficar rolando o dedo na tela do celular de maneira indiscriminada e sem objetividade, deixando o sujeito alienado – na maioria das vezes em notícias tristes, negativas e pouco produtivas.
Desde março de 2020, psicólogos e especialistas comportamentais observaram que muitas pessoas adquiriram o vício de buscar todos os tipos de informações sobre a Covid-19, formas de contágio, prevenção, vacinas, e passaram a se deparar com um universo de negatividade, fake news, áudios duvidosos etc. Nesse contexto, emitiram um alerta: o doomscrolling pode levar as pessoas a ficar mais ansiosas, cansadas (física e mentalmente), com a falsa sensação de estarem informadas (pois elas deixam de distinguir informações reais das falsas). E é aí que eles indagaram: qual a diferença entre estar bem informado e ser inundado com muitas informações que não vão acrescentar nada à sua vida?
“Acredito que o doomscrolling esbarre na curiosidade do ser humano em ficar navegando desgovernadamente pelas redes – para distrair-se do tédio, para passar o tempo ou mesmo por vício. Quem nunca? E depois desse período mais tenso da pandemia, muitas pessoas se acostumaram à essa dependência do smartphone e passaram a navegar por horas em sites e redes sociais sobre fofocas, moda, decoração e em mundos totalmente à parte do seu; colocando foco em futilidades ou informações sem conexão com sua realidade, justamente para se sentirem mais confortáveis frente a tantos desafios e incertezas vividos, na vida profissional e na vida pessoal”, comenta David Braga, CEO, board advisor e headhunter da Prime Talent Executive Search.
Análise feita pelo pesquisar norte-americano Dean McKey, da Universidade de Fordham, especializado em comportamentos compulsivos e transtornos de ansiedade, mostrou haver um componente evolucionário nisso. “Os seres humanos se desenvolveram ao se adaptar aos desafios do ambiente, e isso pode explicar biologicamente a compulsão por informações”, comentou o professor de Psicologia em uma entrevista dada à rede BBC. Segundo McKey, todos os estados emocionais humanos surgiram porque eram de alguma forma adaptativos. Então, sentir indiretamente uma certa emoção ao ler notícias ou comentários, como raiva ou desespero, pode ser uma
maneira de “praticar mecanismos de enfrentamento evoluídos” que desenvolvemos para gerenciar eventos negativos da vida. Estar com medo, por exemplo, nos coloca em alerta máximo, o que é útil em situações perigosas.
Nesse contexto, David Braga, que também é conselheiro de Administração pela Fundação Dom Cabral (FDC), da ACMinas e da Associação Brasileira de Recursos Humanos de Minas Gerais (ABRH-MG), acredita que o hábito das pessoas em consumir ainda mais as informações – positivas ou negativas – via smartphone ou computador é crescente. “A questão primordial é que nunca foi tão fácil encontrar a informação e também desencontrá-la. A era digital traz o fenômeno da “infotoxicação”, ou seja, a intoxicação pelo excesso de informação. Estamos lotados de dados, números, frases de efeito da hora em que acordamos até a hora de dormir. Seja buscando notícias sobre o trabalho, o mundo corporativo ou hobbies e distrações da vida pessoal. Consumimos em excesso, mas e a qualidade, e a fonte da informação? Estamos dando valor para essa fonte?”, questiona.
Se procuramos na própria internet, há várias dicas em formato de “passo a passo” sobre como reduzir esse consumo excessivo de informações no nosso dia a dia: entre eles, evitar ficar com o aparelho ligado até a hora de se deitar; desligar as notificações dos APPs; não acordar e se conectar imediatamente ao WhatsApp; colocar um timer para reduzir a navegação pelo Twitter, enfim…
“Diante desse cenário, é possível afirmarmos haver uma dicotomia: ao mesmo tempo em que somos inundados pela enxurrada de notícias, sem atualizações necessárias podemos nos tornar ultrapassados e poderemos até mesmo nos tornar obsoletos. Os profissionais terão cada vez mais que se autoestimular para aprender, desaprender e reaprender, considerando isso como um processo contínuo de aprendizado de vida. E faz parte desse processo se educar para consumir, com equilíbrio, as informações que escolhe ler e reter”, analisa David Braga.
Para o headhunter, “a busca pelo conhecimento é fundamental, desde que com equilíbrio. Quanto ao autoconhecimento, também se faz necessário para que você saiba que tipo de informação lhe agrega. Todavia estar antenado às tendências de mercado que surgem é de vital importância para aqueles que querem ter êxito profissional. Como sempre, a vida pede equilíbrio e muita maturidade emocional. Ter esperança em novos cenários, manter o otimismo, aumentar nossa espiritualidade e triar as informações que queremos absorver faz parte de uma vida com sabedoria”, complementa.