“Era uma vez um mundo em que todos trabalhavam cinco dias por semana dentro das empresas”… Essa não é mais uma história encantada e tem se tornado cada vez menos realidade, em especial para as organizações mais estratégicas, que após dois anos da pandemia da Covid-19 entenderam que os profissionais têm buscado equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Muitas, aliás, já se acostumaram ao conceito de “no where”, ou seja, não importa de onde seus colaboradores estejam trabalhando, desde que mantenham a produtividade em dia. Não à toa o nomadismo corporativo tem ganhado mais força nos últimos tempos.
Pesquisa realizada pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), em parceria com Fundação Instituto de Administração (FIA), indica que a tendência para 2022 é de que o home office se estabeleça como sistema de trabalho definitivo para muitos profissionais. “A opção pode deixar de ser meramente emergencial e ganhar status oficial em muitas empresas. Os modelos home office e híbrido (que alterna presencial e casa) ganharam mais força em organizações que jamais pensariam em atuar nestes moldes. Pensar como fazer o retorno presencial – total ou parcial é decisão atual e urgente, uma vez que a vacinação se mostrou eficaz para controlar a propagação do vírus em larga escala e muitos países estão deixando o status de pandemia para endemia”, aponta o headhunter e CEO da Prime Talent Executive Search, David Braga.
Em 2020, primeiro ano da pandemia, 70% dos entrevistados revelaram desejo de seguir em home office após o fim da crise sanitária, segundo o estudo da FEA-USP/FIA. No ano passado, o número chegou a 78%, indicando que um número maior de profissionais se sente mais confortável com a rotina de trabalho remota devido a vários fatores, entre eles, a gestão do seu próprio tempo. “A pandemia trouxe uma reflexão muito profunda sobre as relações de trabalho – o trabalhador é mais produtivo cumprindo a jornada laboral dentro da empresa ou fazendo a gestão do seu tempo em casa, mesclando trabalho com outros afazeres? Muita gente reclamou do excesso de horas trabalhadas, da rotina extenuante, mas é sempre preciso fazer um balanço e pesar prós e contras”, comenta David.
A pesquisa da USP também mostrou outros dados interessantes sobre a nova realidade de trabalho: um deles é sobre a satisfação dos profissionais em home office. Em todos os quesitos abordados pelo estudo – realização profissional, reconhecimento da empresa, melhora da qualidade de vida – ela aumentou sensivelmente. Segundo o levantamento, cresceu também o percentual de profissionais que acreditam que produzem mais e melhor a partir de suas casas – o que pode ser muito interessante para as empresas. Para 81% dos entrevistados, sua produtividade é maior no home office – em 2020, esse número era de 73%.
Competências e habilidades – Diante desse cenário, líderes e liderados precisam estar abertos para os rumos que o modelo de trabalho a ser adotado vai tomar daqui para frente. Se para o líder o desafio foi fazer a gestão à distância, com foco na performance e menos no poder e controle, do lado do colaborador foi necessário aprimorar competências e habilidades, as tão faladas soft skills de autogestão, organização, planejamento e acuracidade na gestão do tempo, lidando no paralelo com os afazeres domésticos.
“Acredito no poder da adaptação, atitude necessária para os tempos atuais. Ainda há vários questionamentos se é prudente manter o home office, o modelo híbrido ou presencial 100% nas empresas. Como sempre, o extremismo nunca trouxe resultados positivos”, acrescenta o headhunter. Segundo ele, o que outras pesquisas têm mostrado é que a mescla dos modelos home office e presencial indica ser o mais sábio a ser feito, pelo menos em curto prazo. “Dessa forma, cabe à área de RH e às lideranças refletirem quem pode estar em cada um dos modelos e praticar a escuta ativa, questionando os colaboradores e construindo isso juntos, de forma cocriativa, se não quiserem perder seus melhores talentos. Vale lembrar que hoje, tal qual a empresa escolhe quem ela quer trabalhando no seu time, o colaborador também opta em qual organização quer atuar”, conclui.
- David Braga é CEO, board advisor e headhunter da Prime Talent Executive Search. É também Conselheiro de Administração pela Fundação Dom Cabral (FDC) e professor convidado pela mesma instituição. Ele é autor do livro “Contratado ou Demitido – só depende de você” e atua, ainda, como conselheiro da ONG ChildFund, da ACMinas e da Associação Brasileira de Recursos Humanos de Minas Gerais (ABRH-MG). Instagram: @davidbraga | @prime.talent.